o problema não é o marido

 

O desapego, ou "soltar", "largar", "abrir mão de" é sempre difícil de compreender - sobretudo para quem começa a praticar meditação... mas não só.

E é muito comum, mesmo depois de uma grande explicação, continuarmos a pensar que para "estarmos bem" temos de mudar de emprego, de país, deixar o marido ou a mulher, ir viajar ou ir viver para o campo. Claro que tudo isso é possível. Mas quando se fala de "largar" no contexto de uma prática, estamos a falar de largar o que em nós não permite que aparentemente nada funcione na nossa vida. Largar a dualidade do desejo e da aversão. Largar o complexo de vítima (sou eu sempre que me preocupo, os outros não querem saber). Largar o complexo de salvador que me faz achar que só eu é que sei o que os outros devem fazer... ou, pelo contrário, permanecer à espera que algo ou alguém, um milagre, me venha salvar. Largar as minhas ideias pequenas e rígidas sobre como as coisas deveriam ser, sobre como deveria ser a vida, ou como os outros me deveriam tratar. Largar o meu narcisismo míope que acredita que tudo gira à minha volta... mesmo quando penso que estou a ser altruista.

É preciso coragem para realmente olhar para nós... Mas a opção é viver num mundo muito reduzido e claustrofóbico... a tal garrafa de que fala o Francis e que não nos deixa ver outras opções.

A quietude e a sabedoria só surgem quando nos decidimos a "sair do caminho" - quando este eu pequenino se rende.


Margarida Cardoso