Parece que um dos maiores medos atuais é sermos descobertos e apontados como uma fraude. Medo de parecermos seguros demais, ou dizer que entendemos disso ou daquilo, até surgir alguém de trás da moita e nos “desmascarar” em um momento dramático que arruinará nossas vidas.
(acho que isso se chama: assistir novelas demais)
Já passei noites preocupadíssima com o que os outros fossem pensar de mim, sobre meu trabalho, sobre minhas ideias: “eles vão saber que eu sou uma fraude!” E me desesperava.
Com o tempo, comecei a perceber que eu não era a única; que por trás daquela pessoa super segura, confiante e que chegava a me intimidar, também havia alguém com medo de ser apontada como fraude. Alguém que tentava não transparecer, mas também não sabia exatamente o que estava fazendo. Em outros casos, eu via claramente que a pessoa não estava no controle. E que tudo bem.
Foi quando vi que me desesperar era inútil.
Um exemplo. Para não dar muito spoiler da história: escrevi uma cena em que um personagem precisa entrar numa missão super perigosa e arriscada, e ia acompanhado apenas de uma pessoa; mas uma profissional, uma especialista naquela missão.
Por algum motivo, no meio do caminho o personagem entra em pânico porque percebe que aquela pessoa, na verdade, não sabe o que está fazendo. Ele fica desesperado, tenta voltar e pensa meu deus eu vou morrer, porque o tempo todo estava confiando numa pessoa que, no final das contas, era tão falha e vulnerável quanto ele.
É a comédia da tragédia humana em ação: porque chega a ser engraçado como nos apegamos à certeza de estarmos no controle e, quando vemos que não estamos, vem aquela sensação de onde é que eu seguro, socorro?? A questão é: não há onde se segurar.
Tudo o que você pode fazer é seguir o maior conselho do Guia do Mochileiro das Galáxias e… não entrar em pânico.
Don’t panic porque não estamos sozinhos em não saber o que estamos fazendo, em perder o controle. Don’t panic porque tudo bem não saber, tudo bem não estar no controle, tudo bem errar, e sobretudo, tudo bem sermos esse eterno processo em construção, que sempre vai ter mais o que aprender sobre fazer alguma coisa.
A Olivia Maia estava falando de processos na última
newsletter dela. O processo de escrever. Sobre como ela acabava deixando os trabalhos de faculdade pra última hora e no final acabava dando tudo certo (quem nunca fez isso, que atire o primeiro TCC). Confiar no processo.
Mas o que eu queria apontar mesmo é quando ela conta do processo de desenhar, muito mais penoso pra ela. E um amigo dela fala: “se você sofre pra desenhar, não desenha e pronto”. Ela conclui:
“porque é isso, né: a gente não precisa ser nada. e se não tem ninguém obrigando, por que precisa a gente mesmo assumir esse papel?"
É verdade; no final das contas, só há uma pessoa apontando o dedo para a gente. Nós mesmos. O resto das pessoas, francamente, está cagando para o fato de sermos ou não uma fraude, porque cada um já tem sua própria dose de paranóias e neuras pessoais para administrar.
Então vamos aos fatos: eu não sei o que eu estou fazendo.
Tenho 100% de certeza de como criar um personagem, escrever uma história, lançar um livro, ganhar algum dinheiro como autora independente? Pfff, não mesmo.
Eu mal sei o que estou fazendo nesse grande negócio chamado vida. Até certo ponto eu tinha mais ou menos a ideia de que eu precisava tirar notas boas, terminar o colégio e conseguir algum emprego. Faculdade podia ou não fazer parte dessa equação. Passei por todos esses passos, que era o máximo de roteiro que me deram para administrar minha existência nesse planeta, e agora eu preciso ser bem sincera em dizer que tudo o que veio depois disso eu fiz sem ter certeza de nada.
(inclusive hoje questiono se as pessoas que me disseram que essas coisas eram necessárias na vida também sabiam o que estavam fazendo)
Veja bem, até essa newsletter. 70 edições nas costas e ainda estou tentando ver o que funciona, experimentando, às vezes improvisando como quem deixa para fazer um trabalho de faculdade na última hora.
Desculpa te decepcionar.
Às vezes penso se as pessoas que assinam minha newsletter, leem meus textos ou até pagam voluntariamente pelo meu trabalho esperam que eu seja essa pessoa que sabe o que está fazendo o tempo inteiro; ou se elas me acompanham e me financiam justamente por entenderem que estamos todas no mesmo barco e, apesar de tudo isso, confiam no meu processo (pegando as palavras da Olivia)?
Porque posso não saber o que estou fazendo, mas se eu seguir trabalhando, um trabalho baseado sobretudo na aprendizagem e experimentação, sei que essa estrada vai dar em algum lugar. Onde, não sei. Mas agradeço a confiança de quem me segue nessa jornada sem o sentimento daquele meu personagem que pensa MEU DEUS EU VOU MORRER, ESSA LOUCA NÃO SABE O QUE ESTÁ FAZENDO.
O importante é não entrar em pânico.