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Oi, <<First Name>>

Espero que você esteja bem e saudável. Sei que não estamos em nossos melhores dias. A essa altura a quarentena já está cobrando o seu preço. Estamos mais irritados, mais solitários, mais tristonhos. Não sei se acontece o mesmo com você, mas ando com uma dificuldade imensa para me concentrar. As contas continuam chegando, mas o dinheiro já está no fim. É difícil encontrar alguma tarefa que me tire completamente do dia-a-dia. Escrevo um pouco, desenho um pouco, navego um pouco e passo o dia torcendo para o pesadelo acabar. Enquanto isso sempre temos os livros.
O que você está fazendo para passar o tempo dentro de casa?
Quando eu era criança, alternava as aventuras na mata com longas horas de leitura trancado no quarto, devorando clássicos como Viagem ao Centro da Terra, A Ilha do Tesouro, Caninos Brancos e as aventuras de Sherlock Holmes e ficava com essa sensação de que enquanto eu tivesse um livro nas mãos, minha mente não poderia ser confinada.
Uma vez caiu nas minhas mãos uma revista “Planeta”, especial sobre yoga e meditação e eu descobri o relato de algumas pessoas que literalmente libertavam sua mente do corpo para viajar pelo cosmos. Tentei aquilo por algum tempo, mas era difícil me manter quieto.
Talvez por causa dessas histórias a quarentena não me incomode tanto. Sinto falta das pessoas, claro, mas o silêncio sempre foi um lugar que considerei confortável. O silêncio tem gosto de casa.
É com a ajuda desse moleque estranho que fui um dia que eu tenho lutado contra esses dias sombrios. Navegamos juntos por mares misteriosos e nos aprofundamos em cavernas cheias de monstros jurássicos. Transmitimos nossa mente para as estrelas e assistimos juntos a ascensão e queda de impérios galácticos. Minha mãe já sabia que eu não importava de ficar de castigo. É bom o vírus saber o mesmo.
Fique bem.
Grande abraço,
Diego

#Uma palavra para o fim do mundo

A morte tilintava a colher na xícara de café. A tranquilidade do seu sorriso era mais assustadora do que a arma sobre a mesa ou o seu currículo de assassinatos. Encontrá-lo na cozinha era o suficiente para saber que o jogo tinha terminado.
– Desculpe a liberdade. – A morte disse, indicando a xícara.
– Sobrou um gole? – Contornei a mesa por trás dele.
Alguém menos seguro temeria um golpe e uma tentativa de fuga. O mensageiro apenas puxou a cadeira para me dar passagem. O café ainda fumegava na garrafa térmica. Do vitral da cozinha eu podia ver o mundo despertando do lado de fora. Um dia cinzento e sem graça, como todos os outros.
– Como me encontrou? – Era minha única dúvida.
Meu assassino ergueu a mão, dando de ombros, indicando que não se importava ou não sabia. De verdade não tinha importância. Havia vivido mais anos do que tinha imaginado e alguns deles até tinham sido bons.
– Estivemos ocupados, muitos assuntos para resolver.
Eu acenei com a cabeça, mesmo que ele não pudesse me ver. Tinha visto os jornais, cada morte era um passo na minha direção. Cada dia eu acordava me perguntando se tinha chegado a minha hora. A espera tinha acabado. Retirei do armário um vidro de biscoitos e me sentei a sua frente.
– Você sabe que isso não vai resolver nada, não sabe?
– Não sei. Talvez resolva. Certas coisas precisam ser esquecidas.
– Se eu te entregar o envelope, você pode me deixar vivo.
– Não é assim que funciona. Você sabe.
Sabia. O contrato estava aberto e aquilo só terminaria quando eu estivesse morto. Era assim que funcionava na minha época e eu duvidava que as coisas tivessem mudado nos últimos anos, mas não custava perguntar.
Mordi o biscoito velho e me arrependi. Já era triste morrer em um dia cinzento, seria mais triste ainda com o gosto de biscoito velho na boca. O café, pelo menos, estava bom.
– Está no maleiro, em um plástico fechado com fita. – Falei mal-humorado. – Eu devia tê-lo queimado quando tive chance.
Sua expressão foi gentil e tentava me consolar.
– Quem queimaria algo assim? Além do mais, o que adiantaria? Ele não foi escrito em pele de carneiro ou em papiro. O meu foi anotado em uma nota de cruzeiro. O seu foi escrito em uma folha de caderno. Já pensou no que isso significa?
– Que cinquenta anos atrás alguém morreu com ele na mão.
– Sim, mas de onde ele veio? De onde algo assim pode vir? Alguém espalhou essas mensagens por ai.
Foi minha vez de sorrir. Já tinha me feito todas aquelas perguntas antes. Aquele envelope era como andar com uma bomba atômica no bolso. Uma doença que não deixava rastros. A arma perfeita presa em um papel vagabundo, como uma lista de compras.
– Estou velho para essas perguntas. – Tomei o que restava do café.
– Mas te faz pensar, não é? – Ele procurou por cigarros no bolso da camisa. – Em algum lugar alguém deve ter deixado isso escapar. Não alguém como eu ou você, claro. Alguém muito acima de todos nós. Em algum lugar no céu ou no inferno um estagiário anotou a senha do universo e deixou cair da carteira quanto estava no posto de gasolina. Deve ter sido um dia péssimo no escritório.
– É isso o que você acha que é? A senha do universo? – Recusei o cigarro que ele me ofereceu, depois pensei melhor e preferi isso a alternativa do gosto de biscoito velho na boca.
– Tem outra explicação? 
– O nome de Deus? Uma senha de autodestruição? A palavra de segurança de uma orgia que deu errado.
Ele riu. Me assistiu dar uma longa tragada. Quando ameacei me levantar para ir buscar o envelope, ele fez um gesto para me sentar e o colocou sobre a mesa. Entender que o desgraçado havia entrado no meu quarto enquanto eu dormia e não tinha me matado parecia um desrespeito maior do que qualquer outra coisa, mas então me dei conta do motivo pelo qual eu estava vivo. Ele queria ter certeza.
– Abre. – Ele confirmou minhas suspeitas me indicando o envelope. Fazia sentido. Ele só saberia se era o bilhete certo se visse acontecer.
– Bem, eu acho que mereço isso.
Puxei o envelope na minha direção e lutei contra a tremedeira para abri-lo. Dentro dele estava o pequeno papelzinho dobrado ao meio, amarelado e gasto pelo tempo. Era a primeira vez que eu o segurava nas mãos daquela forma, normalmente eu era apenas o mensageiro. Meu trabalho era entrega-lo a quem precisava lê-lo e recolhê-lo depois que tivesse feito o trabalho. Havia todo uma questão de segurança envolvida, claro. Como se estivesse lidando com material radioativo, mas supus que não poderia manter os olhos fechados por muito tempo.
– Você sabe o que vai acontecer quando eu ler o bilhete?
– Vai ser enlouquecido pela grande verdade universal? Vai invocar um deus do espaço profundo para arrancar sua alma? Vai ascender como buda à outra dimensão? O quê?
– Vamos descobrir. – Respirei fundo e abri o bilhete sabendo que aquilo seria a última coisa que veria. A palavra atravessaria meus nervos óticos até encontrar um lugar para se instalar em meu cérebro, então se espalharia ganhando cada célula do meu corpo. Haveria um pequeno tremor, uma expressão de terror e deslumbramento, então tudo ao meu redor permaneceria, exceto eu mesmo. O mensageiro recolheria o bilhete do chão de olhos fechados, tateando a escuridão enquanto lutava contra a própria curiosidade. Uma breve olhada, uma voz lhe diria. Apenas algumas letras. Aquela tentação de saber lhe consumiria durante todos os dias da sua vida, mas no fim ele também descobriria. A senha do universo. O nome de Deus. A grande verdade. O nome do seu verdadeiro amor. Uma única palavra, capaz de nos devolver ao pó.

#Sublinhado


“Existem três tipos de pessoas: os de cima, os de baixo e os que caem.”

O Poço
 

“O que torna as pessoas sociáveis é a sua incapacidade de suportar a solidão e, nela, a si mesmos. ”

– Arthur Schopenhauer

#O Poço

O Poço, (Netflix), é a história de um homem confinado em uma prisão vertical, com centenas de níveis que são conectados por um poço, por onde as pessoas são alimentadas. Todos os dias, um elevador desce andar por andar levando um banquete para os prisioneiros. Existem duas regras: os que estão no andar de cima comem primeiro e a cada mês as pessoas mudam aleatoriamente de andar. Com uma produção simples e um roteiro redondo, a história discute a violência organizada do capitalismo ao mesmo tempo em que demonstra os riscos dos sistemas totalitários, mesmo aqueles que se dizem com boas intenções. Competente, apesar de não ser extraordinário, a comparação com outros longas críticos como Parasita, ganhador do Oscar 2019, não chega a ser justa já que este é apenas o primeiro longa de Galder Gaztelu-Urrutia, que antes tinha dirigido apenas 2 curta-metragens. O Poço é uma história visceral e carregada de violência, mas com intenções filosóficas de definir quem somos e do que somos capazes para sobreviver.

#Ossos do Oficio

Depois de anos no ar meu site caiu graças a um ataque hacker. Lendo essa frase você pode acreditar que meu site tem alguma importância política ou filosófica, mas não, foi um simples ataque de algum espertalhão que consegui redirecionar meus visitantes para um site de apostas online. Sim, parece piada, mas a dor de cabeça é bastante real. Ainda estou tentando resolver o problema. Mandem-me energias positivas.
Tenho aproveitado a quarentena para organizar alguns processos, principalmente referentes à Gazeta Ordinária, aos Contos Postais e ao Site, que acabaram tomando bastante tempo da minha rotina, enquanto isso o Volume 2 das Chamas do Império estão na geladeira. Para falar sobre isso escrevi um artigo que vou disponibilizar assim que o site voltar ao ar.
A novidade atual é que os Contos Postais, que são recompensa para alguns assinantes do Catarse agora estarão disponíveis em formato digital para todos os assinantes. É minha forma de agradecer pelo apoio de todos vocês.

#Agradecimentos

Meus agradecimentos ao Victor Burgos, Camila Fernandes, Ana Lúcia Merege, Brena Gentil e Mariana Sgambato que deram seu apoio no catarse para fazer com que esse boletim saísse da caixa de ideias.

Se você leu até aqui

Se alguma dessas bobagens te interessou, talvez você queira dar uma olhada no conteúdo do meu site, onde publico artigos, contos e crônicas gratuitas periodicamente. Nele você pode também comprar alguns dos meus livros e me ajudar a pagar pela ração dos dois demônios que moram comigo.
Para aqueles que estejam se sentindo particularmente generosos (ou culpados de ficar baixando livro pirata, seus danadinhos), estou com campanha aberta no Catarse para financiar uma parte destas loucuras e conseguir viabilizar alguns projetos. A partir de R$5,00 você já me paga um café e garante que eu não durma antes de entregar o próximo capítulo.
A meta do catarse estacionou em 20% a algum tempo. É com esse dinheiro que consegui materializar os Contos Postais dos apoiadores, com ele ainda pretendo lançar um fanzine e uma novela seriada, mas antes de mais nada, estou economizando o dinheiro para colocar o site em ordem contratando um programador.
Você não precisa ajudar, mas se quiser, garante uns mimos. :)

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Diego Guerra | Fantasia e Ficção Científica · Rua de Casa · São Paulo, SP 00000000 · Brazil

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