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Uma mulher. Escrevendo. Seus problemas. E mudando a internet brasileira.
Ano 5, edição 73
Oi, você! Tudo bem?


Achei que colocar uma saudação logo no começo ia tornar mais fácil o processo de escrever isso aqui. Nessas últimas semanas eu já abri e fechei esse arquivo várias vezes, eu acabava achando que nada do que eu escrevia soava muito sincero ou interessante, aí eu desistia de novo e deixava pra uma próxima oportunidade, que nunca chegava. A mágica das palavras certas na hora certa parece que esqueceu o caminho da minha casa.

Eu não estou bem agora, e isso já é um eufemismo. Na verdade eu tô afundada numa substância tão repulsiva que eu nem encontro uma palavra entre as escatologias conhecidas. Eu não estava assim em junho, quando eu fiz uma viagem exaustiva demais mas tão boa também que eu vou guardar pra sempre como um docinho no meu coração.

Acho que eu não estava assim logo que cheguei em casa, ou umas três semanas atrás. Eu não sei direito como foi acontecendo, mas acho que as coisas foram se acumulando. Eu voltei de viagem muito exausta, nos primeiros dias nem levantava. Ao longo de julho eu tive várias crises de dor da própria fibromialgia mesmo, além de muita dor de estômago porque foram três semanas comendo além do meu limite e além do que uma pessoa com refluxo deveria comer.

Três semanas entre Estados Unidos e Canadá. Três semanas em que eu iludia a besta fera se formando no meu estômago usando só antiácidos.


E ainda tinha o problema do meu pé, porque tudo no meu corpo é um problema. Eu tenho fascite plantar no pé direito, o que já me levou pra fisioterapia e também pra uma gastrite por uso de antiinflamatórios. Eu andei demais nessa viagem, como em geral se anda em viagens, e acho que não levei o melhor tênis que poderia ter levado. 

Meu calcanhar hoje é uma lembrança do que foi meu calcanhar um dia. Mentira, tá um pouco melhor porque fui pro médico e tomei uma injeção de corticóide pra pelo menos voltar a andar direito. Essa semana eu volto pra fisioterapia, que eu detesto, mas tenho esperança de que esse seja o problema mais fácil de resolver.

E como desgraça sempre vem em bando, peguei uma gripe horrível que já dura duas semanas e nem foi embora completamente. Na fase da tosse eu comprei um xarope pra pelo menos amenizar a situação e desconfio que ele tenha interagido com algum dos remédios que eu tomo, ou com todos.

Quarta feira da semana passada eu acordei com a maior dor de cabeça que eu já senti na vida, de longe. Era uma dor do lado esquerdo, mais perto do olho, e eu mal conseguia viver, respirar, imaginar uma existência além de um sofrimento tão absurdo. 

Desde então eu tenho acordado todos os dias com uma dor que é bem menor que a primeira mas que enlouquece por ser tão constante. E fica sempre a lembrança da minha via crucis do ano passado, quando eu passei meses e meses sofrendo com a dor de cabeça que absorveu todos os aspectos da minha vida.

Uma outra questão é que viajar fez de mim uma brasileira em modo descanso. Não que eu tenha deixado de acompanhar as notícias ou de me importar, mas é diferente quando o mundo à sua volta tem outro ritmo, outros feriados, outras preocupações.

Conversar com americanos cansados do Trump ou com brasileiros expatriados que não sabem quando vão poder voltar pra casa te faz uma turista na terra do sofrimento alheio, não a ilustre moradora de Miseravelândia. Isso você só volta a ser em casa mesmo.

Eu queria muito oferecer uma palavra amiga, ou uma dica de como sobreviver ao caos e à destruição que têm sido as nossas vidas desde a eleição passada, mas eu realmente vou ficar devendo. E pra quem diz que é só se desligar, toma aqui uma estrelinha na testa porque você é ó, demais.

Semana passada parece que foi a pior semana, pelo menos entre as pessoas do Twitter. E como a Eliane Brum já falou no texto dela, estamos doentes de Brasil. Aí você imagina a galera que assim como eu nem estava muito saudável antes.

Pra seguir vivendo uma vida normal, dessas de sair de casa, rir de coisas engraçadas, se chatear com o que chateia, conviver com outras pessoas, chegar em casa e dormir, é preciso um pouco de ilusão. Na verdade eu acho que ilusão não é a melhor palavra, é preciso um sopro mínimo de esperança, uma carapaça de proteção das grandes desgraças do mundo. 

Nesse exato momento eu estou em carne viva, aquela ferida que não cicatriza nunca porque você tá sempre arrancando a casquinha. Eu me sinto sozinha e sem ajuda, andando num túnel comprido e cheio de meleca no chão. Eu fujo de pessoas, pessoas fogem de mim, e a minha memória é tão ruim que eu não consigo mais lembrar quem é quem.

Tem problemas que eu já achava que estavam resolvidos mas resolveram problematizar de novo, e tem uma parte da minha cabeça que nunca superou a matemática da escola e fica fazendo análises combinatórias de tudo que é horrível e cometendo erros que nunca vão ser corrigidos também, porque eu nem tenho mais quem corrija minhas contas de análise combinatória.

E tem a Solange, lembra dela? Acabou de acenar aqui.

Mas semana que vem eu vou passar a fazer natação e tudo vai se resolver. Toda a energia que eu poderia gastar em ruminação eu vou gastar em braçadas, e com a cabeça enfiada na água a gente mal percebe que ainda existe um mundo. No espaço ninguém pode te ouvir gritar, na água também não, então dá pra desesperar à vontade porque tudo o que sai de lá são as mesmas bolhas que já iam sair de qualquer jeito.

E quem sabe, talvez só com terapia e natação eu nem precise voltar a tomar antidepressivo. Vou colocar alguma parte ainda boa da minha cabeça pra calcular essas probabilidades.

Eu espero que pra você esteja tudo incrível de tão bom, mas se não estiver, pode contar pra mim, que aí a gente sofre junto. E se estiver me conta também, porque sempre acende uma luz na nossa vida saber que a alegria ainda existe e está na casa de alguém.

Beijo grande, e até mais

Camila
Essa aí da foto é Camila, que sou eu.
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