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Flávio Nunes

ECO Tecnologia

por Flávio Nunes, Coordenador

O que são NFTs (e como entender este nosso mundo)


Até para um millennial como eu, foi difícil entender a lógica por detrás dos NFTs. Não vieram salvar o mundo, isso é certo. Mas quando uma imagem de computador é vendida por 69,3 milhões de dólares num leilão, é impossível não erguer o sobrolho.

Refiro-me à obra “Everydays - The First 5000 Days”, da autoria de Beeple, uma composição de imagens em formato JPEG que foi disponibilizada pela leiloeira Christie’s - pode ver parte da obra mais abaixo, nesta mesma newsletter. A venda milionária fez de Beeple o terceiro artista vivo “mais caro” da história.

Mas o que se passa aqui? Foi o que me questionei quando li a notícia, depois de já me ter deparado com a sigla noutras ocasiões. Por isso, ao longo das últimas semanas, tenho vindo a recolher informação sobre o assunto, por interesse profissional e, admito, muita curiosidade pessoal.

Vou tentar, assim, explicar o que são os NFTs de uma forma muito simples: é uma tecnologia que permite verificar a titularidade de um ficheiro digital.

Até aqui, qualquer ficheiro, como uma imagem, podia ser copiado e colado vezes sem conta, gerando múltiplas cópias de um original desconhecido. Em contrapartida, um ficheiro associado a um NFT permite a qualquer pessoa saber qual é o ficheiro original. E, mais importante ainda, quem é o seu dono.

Muito confuso? Não desista já. Também a mim, à primeira vista, me pareceu uma solução à procura de um problema.

Foi este o exemplo que me fez perceber melhor a questão: qualquer um de nós pode ir à internet ver e até descarregar uma imagem de Mona Lisa; mas é do conhecimento geral que a famosa obra de Leonardo da Vinci, La Gioconda, está exposta e faz parte da coleção do museu do Louvre, em Paris.

Descarregar a imagem da Mona Lisa da internet não faz de mim o dono da Mona Lisa. Nem a imagem descarregada é a Mona Lisa. O quadro original está bem guardado. E, por mais cópias digitais que eu faça, isso não faz de mim o detentor de várias Mona Lisa.

A diferença é que, nesta fase, os NFTs só funcionam para ficheiros na internet, pelo que a promessa é a de revolucionar os horizontes da arte e da cultura digitais. 

Esta tecnologia recorre à blockchain, uma espécie de livro de registos virtual, para assegurar que a propriedade do ficheiro é imutável, publicamente verificável e até transmissível. Por isso, chegou o momento de lhe explicar que a sigla “NFT” significa Non-Fungible Token.

Não se assuste, porque é fácil de perceber através de outro exemplo. O dinheiro é fungível. Cinco moedas de um euro na minha carteira podem ser trocadas por uma nota de cinco. Posso ainda trocar cada moeda de um euro por outra moeda de um euro, sem perder qualquer valor. 

A lógica dos NFTs é exatamente a oposta: cada NFT é único, singular, e o ficheiro que lhe está subjacente é detido por uma só pessoa, cujo “nome” fica registado na blockchain, o tal livro de registos.

Ao registar um NFT na blockchain, passo a ser o dono desse NFT. Isso permite várias coisas, incluindo que o ponha à venda na internet, como fez o artista Beeple. Até aqui, tal não era possível de outra forma, por não existir uma forma de garantir a escassez de um “objeto” digital.

Como é que se cria um NFT? Em primeiro lugar, é preciso ter uma carteira virtual de Ethereum -- que é, simultaneamente, uma criptomoeda (ether) e uma rede pública de computadores (assente na blockchain). O ato de criar um NFT é designado por “mint” e existem sites que permitem a qualquer pessoa fazer “mint” de um NFT.

O Mintable é uma espécie de OLX para NFTs e parece ser um dos mais populares, por ter um serviço em que é a própria plataforma a suportar os custos da operação. De outra forma, fazer “mint” de um NFT pode custar-lhe cerca de 100 euros, ainda que o preço varie, pois é pago em ether, a referida criptomoeda, cujo valor está sempre a subir e a descer (quem beneficia dessa receita são as pessoas que sustentam a própria rede, uma vez que não há qualquer entidade central).

Depois de criar o seu NFT, pode pô-lo à venda. Mas lamento informar que isso não fará de si um milionário do dia para a noite.

A lógica da tecnologia não é necessariamente a da venda, mas sim a da detenção. Só no caso de ser um artista muito conhecido, ou de conseguir atrair a atenção de muita gente, é que poderá ter alguma sorte (eu próprio, por brincadeira e experimentação, criei o meu próprio NFT e - felizmente - ninguém o quis adquirir).

Tudo isto traz algumas vantagens para os criadores de conteúdos, desde a arte até à música. Desde logo, porque a blockchain permite definir royalties que ficam associadas para sempre ao trabalho do artista. Caso a pessoa A venda um NFT à pessoa B, e caso a pessoa B o venda à pessoa C, a pessoa A recebe automaticamente uma comissão.

Mas o sistema não está isento de importantes desafios. Estas novas possibilidades são conseguidas à custa de muitos milhões de computadores permanentemente ligados, a consumirem uma quantidade significativa de energia. Só assim é possível o funcionamento da rede Ethereum da forma que está desenhada atualmente.

Pouparei nos detalhes, mas, basicamente, o método de registo na blockchain é o mesmo que é usado na popular criptomoeda bitcoin e implica que estes computadores resolvam complexas equações. Para se ter uma noção da dimensão, a bitcoin consome anualmente 2,5 vezes a energia usada em Portugal durante o mesmo período.

Feitas as contas, qualquer transação nestas blockchains, seja de bitcoins ou de NFTs, acarretam uma pegada climática, a meu ver, completamente desproporcional ao benefício da tecnologia, numa altura em que a emergência das alterações climáticas já é séria que baste. Bem sei que está a ser preparada uma nova versão da rede Ethereum que vai dar resposta a esta preocupação, mas, até estar resolvido, não deixa de ser uma preocupação.

Digo isto porque a discussão em torno de tudo o que tenha a ver com NFTs ou criptomoedas tem sido marcada por ódios e amores. Por experiência própria, qualquer tentativa de debater a questão é motivo para insultos nas redes sociais.

Mesmo assim, arrisco, terminando com dois apelos. Se é entusiasta destas tecnologias, não se demita de debater os desafios e preocupações que as mesmas levantam. Ninguém sabe tudo, por isso não caia na tentação de não querer saber mais. Argumentar que um problema não é problema só porque há outro problema maior não pode ser admitido, nem tampouco é razoável.

Para os demais, o apelo é que mantenham a mente aberta. “Novidades” como os NFTs vão continuar a surgir, e cada vez mais rápido, à medida que continua o processo de digitalização de tudo o que existe à face da Terra. Ora, como diz a sabedoria popular, "não é possível parar o rio com a mão" nem "tapar o sol com a peneira", pelo que é melhor saber e aprender, para não sermos apanhados na curva. Com este artigo, espero ter contribuído para isso.

 

Crédito: Beeple

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