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BRAIN HUB - conectando mentes disruptivas

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Sarah Telford, diretora do Centre for Humanitarian Data (divulgação)

Dados para salvar o mundo

Dados precisos são centrais a boas políticas e tomadas de decisão. Obter e compartilhar dados entre centenas de organizações, no meio de uma emergência humanitária, é complicado e consome tempo - mas é absolutamente crucial.” (Secretário Geral das Nações Unidas, António Guterres)

Com mais de 70 milhões de refugiados no mundo hoje, será a tecnologia a pedra angular para operacionalizar soluções humanitárias com maior precisão? E serão os dados o combustível disruptivo que pode mudar o jeito de acudir crises humanitárias, sejam aquelas geradas por conflitos, sejam aquelas derivadas dos desastres naturais?

O Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) publicou seu relatório anual, The State of Open Humanitarian Data 2020, que demonstra o impacto que Big Data, AI, e Machine Learning têm em operações humanitárias, e como o uso de modelagem preditiva de dados pode criar maiores eficiências logísticas em operações humanitárias. 

Esta edição do Brain Hub traz uma novidade: a participação da jornalista Maya Plentz na The Shift, na cobertura de como os dados e a tecnologia podem afetar o mundo para o bem ou para o mal. Maya mora na Suíça e circula pelos corredores dos escritórios da ONU em Genebra.

Maya conversou com Sarah Telford, diretora do Centre for Humanitarian Data (CHD) em Haia, na Holanda, que é parte do OCHA, sobre a plataforma de dados disponível para agências humanitárias, e o papel que esta plataforma de intercâmbio de dados, o Humanitarian Data Exchange (HDX), tem em promover o uso de dados confiáveis para orientar e apoiar operações humanitárias, tanto na coordenação de campos de refugiados, quanto no trabalho da ONU e suas agencias após desastres naturais.

Disrupção é...

Antes da HDX, como se pode imaginar, quando as pessoas procuravam dados, tinham que conhecer alguém que pudesse obter esses dados, ou buscar no Google Drive de alguém. Ademais, havia o desafio de não saber de onde eles vinham e se eram confiáveis.

Por isso a HDX foi criada, para centralizar, trabalhar e compilar todos esses dados e garantir a qualidade dos data sets. A plataforma trabalha na área de gerenciamento de informações para agregar, reunir, todas as diferentes partes de uma operação humanitária, para tentar entender de maneira global o que está acontecendo. Ela agrega dados de dezenas de parceiros do sistema da ONU, organizados em seis categorias amplas: Pessoas Afetadas, Geografia, Segurança Alimentar, Saúde, Inserção e Educação.

Alguns data sets são para comparação histórica. Mas a maioria dos dados que priorizamos é sobre o número atual de refugiados ou de deslocados internos, com informações sobre sua localização, por exemplo. A HDX também facilita os esforços de captação de recursos das agências humanitárias da ONU, claro. Países doadores querem ver suas contribuições terem impacto.

A plataforma explodiu, atualmente tem mais de 17.000 data sets e em média 150 mil downloads são realizados mensalmente. 

Ela acaba sendo um pouco como uma "faca de dois gumes". Como fazer sentido desse avalanche de informação? Quais são os dados realmente importantes, quais são os dados mais pertinentes para as operações humanitárias?

Mais de 100 organizações compartilham dados regularmente por meio da plataforma, mas há 28 organizações principais que fornecem dados de alta prioridade, entre elas a agência da ONU para Refugiados (ACNUR), a UNICEF, e o Programa de Alimentação Mundial.

Existem equipes dedicadas em cada agência, gerenciando e limpando os dados, e qualquer equipe de agência humanitária pode usar os dados. É preciso entender que este é um programa em andamento, não um relatório único e fechado. Esses dados, por exemplo, podem ser usados para antecipar necessidades, como foi o caso da crise de Rohingya, onde mais de 700.000 refugiados atravessaram a fronteira para Bangladesh em um espaço de um ano.

O Centro de Dados Humanitários (CHD) foi criado para isso, mas além de fazer a centralização e relacionamento com as instituições que contribuem com os data sets. o Centro também foca na capacitação de pessoal, pois não é suficiente ter dados se as pessoas não podem utilizar.

Outra área de atuação do centro é no desenvolvimento de politicas públicas no gerenciamento de dados. Pois há o perigo de dados revelarem informações pessoais.

Embora OCHA não esteja utilizando dados pessoais, em algumas bases, como as da UNICEF ou do ACNUR, há dados confidenciais que, embora não incluam atributos pessoais como nomes ou números de documentos, podem ser identificado facilmente, pois são plataformas de dados abertas. Se uma análise mais sofisticada for feita, pode haver um risco de identificação de pessoas. 

Em um campo de refugiados, por exemplo, se há apenas uma pessoa com deficiência física e essa pessoa é uma mulher, isso seria possível identificar. 

Agora, com o apoio da Comissão Europeia, o OCHA  vai instalar uma infraestrutura segura na plataforma HDX, um algoritmo, que identificará vulnerabilidades. Como vulnerabilidades mudam constantemente, com hackers sempre procurando por brechas, a segurança de dados está agora em primeiro plano para as organizações, pois elas estão cientes da importância de investir para proteger seus dados, não apenas porque os novos marcos regulatórios em torno da proteção de dados exigem, como o GDPR

Ataques também podem ocorrer em operações humanitárias, não apenas visando um único indivíduo. A HDX é uma plataforma de dados abertos, não tem nomes de beneficiários. Mas, obviamente, existem riscos de derrubar o site, ou usar indevidamente os dados, e isso é algo que olhamos com extremo cuidado. 

Fica claro que a razão da criação do CHD não foi apenas consolidar a informação.  O centro foi criado para informar políticas publicas de utilização de dados, e para oferecer treinamento. O CHD organiza workshops e webinars para o pessoal em agências humanitárias, priorizando os parceiros dedicados que são os principais colaboradores. 

Em 2019, em parceria com a Data Literacy Foundation, fizemos uma ação desse tipo oferecendo treinamento interno no OCHA para seus oficiais de assuntos humanitários que trabalham em diferentes países. Um programa de três meses, uma semana em Haia, e depois alguns meses de treinamento e orientação remotos. Há uma grande demanda por outras partes da organização e parceiros para continuar fazendo isso.

Não estamos treinando pessoal técnico, porque profissionais da área de informática saberão como usar as ferramentas. Estamos visando realmente os tomadores de decisão que precisam fazer as perguntas certas. 

Treinamos essas pessoas para que não tenham medo de usar o Excel, de usar essas ferramentas básicas. O workshop de data literacy é realmente importante. Trabalhamos muito na orientação sobre responsabilidade de dados, dentro do OCHA e com os parceiros que contribuem com os dados.

Outra linha de atuação também agora com a análise de dados e a modelagem preditiva (predictive modeling). Queremos usar a tecnologia para captar sinais relacionados à segurança alimentar, eventos climáticos extremos. Para também desenvolver um programa de financiamento automatizado. Tudo isso em um estágio piloto, ainda não totalmente operacional.

Os dados precisam ser confiáveis, é claro, pois é fundamental para que exista real valor. Mas é um processo lento. Como conseguir que os parceiros e as instituições confiem e colaborem?  Na medida em que a confiança se estabelece, as instituições abrem suas bases de dados.

Lentamente, construindo relacionamentos, dizemos que estamos aqui para ajudar e tornar as coisas mais eficientes a nível do sistema. E fazemos isso trabalhando juntos, reunindo esses dados em um só lugar. E dando todo o crédito aos parceiros que estão compartilhando os dados e não a nós mesmos.

A primeira organização que ofereceu dados, em 2014, foi o Programa de Alimentação Mundial. Eles compartilharam seus dados de preços de alimentos e, em troca, a OCHA propôs construir uma interface de visualização de dados personalizada que mostrasse os dados ao longo do tempo, e eles poderiam incorporar essa interface de visualização e usá-los em sua plataforma. 

Sempre houve um retorno para as organizações. Não se trata apenas de “sugar” dados, mas de construir um relacionamento, uma parceria, dando algo em troca. Então, através disso, criamos confiança, para que as pessoas saibam que somos bons parceiros, que queremos ‘o melhor para os dados’.

Os parceiros sabem que não vamos abusar dos dados. Isso, por sua vez, cria mais compartilhamento e mais demanda. Foi isso que realmente nos permitiu criar o centro. 

Porque se o HDX não tivesse funcionado nesses primeiros anos, não poderíamos ter expandido para cobrir mais fluxos de trabalho e ter o calendário de iniciativas mais amplas, como o centro. Também devo dizer como somos financiados.

Nosso principal doador é o Ministério de Relações Exteriores holandês. Eles estavam muito interessados em dados e inovação e viram que nós também estávamos, então havia um alinhamento de visão. Isso saiu da Cúpula Humanitária Mundial, em 2016, quando houve um grande impulso para novas e inovadoras propostas."

"Uma das maiores oportunidades que temos é tentar usar os dados, e especialmente as ferramentas de análise preditiva para avançar, antecipar, prever, o que está prestes a acontecer e responder a emergências mais cedo".

Mark Lowcock, Subsecretário-Geral de Assuntos Humanitários (OCHA)
 

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